QUEM CONTROLA A FILA DO SUS?

A fila de espera por cirurgias no Sistema Único de Saúde (SUS) cresceu 26% em 2024, em comparação com 2023, segundo dados obtidos pelo Jornal Nacional, da TV Globo, via Lei de Acesso à Informação. O aumento ocorreu mesmo após o Ministério da Saúde lançar, em 2023, o Programa Nacional de Redução das Filas, que repassa recursos a estados e municípios para acelerar os atendimentos.
Hoje, mais de 1,3 milhão de
brasileiros aguardam cirurgias eletivas — procedimentos não urgentes, mas
necessários para garantir qualidade de vida. Só os estados de São Paulo e
Minas Gerais concentram quase metade dessa demanda, com mais de 600 mil
pacientes na fila.
Em São Paulo, a gestão dessa fila
está diretamente ligada ao funcionamento do sistema estadual de regulação,
formado pela CROSS (Central de Regulação de Ofertas de Serviços de Saúde)
e pelo SIRESP (Sistema Informatizado de Regulação do Estado de São Paulo).
Como funciona a regulação
Quando um paciente é atendido em
uma unidade de saúde e, por necessidade clínica, precisa ser transferido para
um hospital com mais recursos, realizar um exame especializado ou agendar um
procedimento cirúrgico, entra em cena o sistema de regulação estadual do SUS em
São Paulo — um dos instrumentos mais estratégicos para organizar o acesso à
assistência e otimizar o uso dos recursos disponíveis.
Esse processo é coordenado pela CROSS,
estrutura da Secretaria de Estado da Saúde, responsável por operacionalizar a
regulação do acesso aos serviços hospitalares e ambulatoriais de maior
complexidade. A CROSS não é um órgão que possui leitos, ambulâncias ou
profissionais de atendimento direto ao público. Sua função é intermediar
as solicitações feitas pelas unidades de saúde e buscar, por meio de sistemas
informatizados, os serviços disponíveis na rede pública.
Para isso, a CROSS utiliza o SIRESP.
Esse sistema centraliza e organiza as solicitações de atendimento feitas pelas
unidades de saúde de todo o estado. É no SIRESP que são registrados os pedidos
de exames, procedimentos, internações, cirurgias e transferências de pacientes
em casos de urgência e emergência.
O SIRESP não é acessível ao
público em geral, sendo uma plataforma exclusiva para os profissionais e
gestores da saúde. Ele integra diversos sistemas, como Regnet Leitos, Regnet
Urgência, Conexa e Hospnet, e é utilizado tanto pelas unidades solicitantes
(postos de saúde, UPAs, hospitais de menor complexidade) quanto pelas unidades executantes
(hospitais e serviços especializados que realizam os procedimentos).
O passo a passo da regulação
- Avaliação clínica do paciente
Ao identificar
que o paciente precisa de um serviço que não pode ser oferecido na unidade em
que foi atendido, o profissional de saúde registra a solicitação no SIRESP,
informando o quadro clínico, exames realizados e a necessidade específica.
- Busca por disponibilidade
A CROSS, por
meio do sistema, verifica a disponibilidade de vagas nas unidades executantes —
hospitais, ambulatórios e centros especializados — que tenham estrutura
adequada para atender à solicitação.
- Acompanhamento e regulação médica
Médicos
reguladores da CROSS analisam os casos, validam as informações e priorizam os
encaminhamentos com base na urgência, na gravidade e na disponibilidade dos
recursos. Quando há vaga compatível, é feita a liberação da transferência ou do
agendamento.
- Execução do atendimento
Confirmada a
vaga, a unidade de origem é notificada e, se for o caso, providencia o
transporte do paciente. A partir daí, a unidade executante assume o
atendimento.
E as filas?
O SIRESP também registra as
chamadas "filas de espera" para exames e procedimentos
eletivos, que não têm urgência imediata. Essas filas são organizadas no Cadastro
de Demanda por Recurso (CDR), um módulo do sistema em que cada solicitação
é inserida com dados clínicos do paciente, tipo de recurso necessário e sua
prioridade.
Em 2023, entrou em vigor a Lei
Estadual nº 17.745, que obriga a divulgação pública da posição do paciente
na fila. Em São Paulo, os pacientes podem ver sua posição na fila pelo
aplicativo Poupatempo.
Desde 2024, a Secretaria de Saúde
passou a exigir a qualificação contínua dessas filas, ou seja, a
atualização obrigatória dos cadastros, sob pena de exclusão. Pacientes que não
têm os dados atualizados, não respondem aos contatos ou que já foram atendidos
sem que a unidade tenha dado baixa no sistema, podem ser removidos da lista.
Isso visa evitar filas infladas artificialmente e melhorar o planejamento da
rede.
Desafios persistentes
Mesmo com ferramentas como o
SIRESP e iniciativas estaduais, o crescimento das filas evidencia gargalos
estruturais. A insuficiência de oferta hospitalar e a alta demanda reprimida
colocam pressão sobre o sistema de regulação, que depende da articulação entre
municípios, hospitais estaduais e gestão central.
Por que isso importa?
Compreender como funciona a
regulação da saúde é essencial não apenas para gestores públicos e
profissionais da saúde, mas também para parlamentares e cidadãos que desejam
acompanhar de perto a eficiência da aplicação dos recursos públicos. A
regulação é uma engrenagem invisível para o usuário, mas decisiva para que o
SUS funcione de forma equitativa e ordenada.
A qualidade do atendimento no SUS
depende não só da existência de recursos físicos e humanos, mas também da organização
do acesso, e nisso, a atuação articulada entre CROSS e SIRESP tem papel
fundamental. A transparência e a constante qualificação das filas são medidas
recentes que buscam garantir que o paciente certo chegue ao serviço certo,
no tempo certo — que é o verdadeiro objetivo do SUS.
Foto: Pedro França – Agência Senado